A superdotação ainda é um assunto pouco abordado na sociedade. Estereótipos associam alunos com altas habilidades apenas a um desempenho acadêmico excepcional, o que contribui para a invisibilidade desses estudantes. No entanto, a superdotação vai além disso, incluindo também características cognitivas, criativas e sociais.
Uma pessoa com superdotação desenvolve seu potencial quando exposta a ambientes estimulantes e experiências enriquecedoras. Alunos com altas habilidades podem não se encaixar nos padrões tradicionais de aprendizagem e sofrerem com frustrações e ansiedade. Por isso, é fundamental que essa temática faça parte dos programas de formação de professores, para que eles possam compreender os desafios acadêmicos, emocionais e sociais desses estudantes.
É o caso do curso “Altas Habilidades: concepções, identificação e atendimento no contexto educacional”, oferecido pelo Instituto SESI de Formação de Professores para os educadores poderem atender e reconhecer o potencial de cada aluno. Conversamos com a professora Denise de Souza Fleith, primeira ministrante do curso, para aprofundar mais o tema abordado.
Denise é psicóloga, PhD em Psicologia Educacional pela University of Connecticut, tem pós-doutorado pela University of Warwick e pela Universidade do Minho. Atualmente, é professora e pesquisadora do Instituto de Psicologia da Universidade de Brasília e presidente do Conselho Mundial para Crianças Superdotadas e Talentosas.
Denise Fleith — A pessoa superdotada é aquela que apresenta um potencial, seja com habilidades acima da média, criatividade, envolvimento ou motivação com a tarefa. Já avançamos muito no significado de superdotação, fomos além da ideia de que o indivíduo superdotado é simplesmente aquele que apresenta um alto QI. Hoje, ampliamos essa visão para incluir outros fatores. Para além da capacidade intelectual, depende muito do domínio, do campo em que esse talento se expressa.
Também não podemos entender a superdotação como um fenômeno pura e exclusivamente nato. “Uma vez superdotado, sempre superdotado.” Não! É importante criar condições apropriadas para que esse potencial possa se desenvolver cada vez mais. Entendemos o fenômeno da superdotação como um processo em desenvolvimento. Por isso, é importante oferecer oportunidades e experiências que tenham significado para o estudante, para que esse talento e seus interesses possam ser desenvolvidos.
Denise Fleith — Reconhecemos o papel dos fatores biológicos, hereditários e genéticos, mas não podemos explicar o fenômeno da superdotação apenas com base nesses fatores. O papel do ambiente é fundamental no desenvolvimento da superdotação. Então, não basta apenas nascer com esse potencial, se ele não for cultivado e estimulado.
É fundamental investir na identificação, no atendimento e na educação da criança com altas habilidades. Se ela não encontrar oportunidades, se não tiver condições de vivenciar experiências que proporcionem o desenvolvimento de suas capacidades superiores, certamente esse potencial ficará adormecido. A superdotação é um processo em desenvolvimento. É necessário estar atento às demandas e criar condições para que esse potencial possa florescer. Por isso, é importante considerar o papel da família, da escola e da sociedade, de maneira geral, no desenvolvimento da superdotação.
Denise Fleith — São muitos os desafios que os professores enfrentam na identificação e atendimento ao estudante com altas habilidades. O primeiro que eu indicaria é a informação limitada acerca de quem é o estudante superdotado. Ainda há muitos estereótipos na nossa sociedade a respeito de quem é esse indivíduo. Muitas vezes, associa-se a superdotação com aquele estudante que sempre tira notas altas, que é um excelente aluno. Mas há estudantes que possuem o talento em outras áreas, que não a acadêmica. Nesse caso, a escola pode ser desmotivadora ou entediante, o que faz com que ele não se envolva tanto nas tarefas escolares, e seu desempenho fique aquém do seu potencial. Isso não significa que ele não possa ser identificado como superdotado.
Então, acho que o maior desafio é a questão da informação limitada sobre o fenômeno, os estereótipos que ainda existem na nossa sociedade e, muitas vezes, a formação limitada do professor, tanto em termos de formação inicial quanto continuada. Em muitos casos, o educador não tem acesso à informação, e isso dificulta o processo de identificação e de atendimento ao estudante superdotado em sala de aula.
Denise Fleith — Desenvolvemos o curso em três etapas. Na primeira, focamos nas bases teóricas. O que é o fenômeno da superdotação? Quem é o estudante superdotado? Quais são os estereótipos e mitos da nossa sociedade sobre esse indivíduo e esse fenômeno? Quais as terminologias?
Na segunda etapa do curso, abordamos a identificação e avaliação desse estudante. Quais são os procedimentos? Como identificar o estudante em sala de aula? Quais os desafios e as dificuldades? Que orientações podemos dar à equipe escolar e à família?
Na terceira etapa, focamos nas estratégias de atendimento educacional. Como atender o aluno que já foi identificado? Quais são as práticas educacionais direcionadas ao estudante superdotado? Serão orientações práticas, tanto para a escola quanto para a família. A parceria escola-família é fundamental para a identificação e para o atendimento às necessidades e características do estudante superdotado.
Denise Fleith — O curso tem o objetivo de trazer informação e criar um espaço de discussão sobre quem é o estudante superdotado. Queremos possibilitar a troca de experiências e o diálogo com os modelos teóricos e com os resultados de pesquisa. Nosso curso é baseado em evidências científicas. Estamos trazendo o que há de mais atual sobre o fenômeno da superdotação. Por isso, é importante essa oportunidade de troca entre o que as teorias falam e o que os professores, que estão “no chão de fábrica”, trazem.
Espero que os educadores possam sair mais sensíveis, com o olhar mais atento ao estudante com altas habilidades, apoiando-o, ouvindo-o, acolhendo-o e criando condições para seu desenvolvimento, tanto pessoal quanto acadêmico e socioemocional. Porque é importante lembrar que o estudante superdotado não é apenas uma pessoa com necessidades intelectuais. Também devemos considerar a dimensão do seu desenvolvimento socioemocional. A escola e a família têm muito a contribuir para isso.
One comment on “Superdotação: qual o potencial e as necessidades do aluno?”
Tive o privilégio de fazer este curso e indico muito. Professora Denise e as demais colegas falam com propriedade e nos trazem muitas reflexões sobre este tema que, não faz muito, tempo que vem sendo discutido nas escolas. Parabéns ao Instituto por este curso com um tema tão relevante e necessário!